Crítica: 6ª temporada de Elite é uma festa que virou enterro
Em sua sexta temporada na Netflix, Elite tenta ser mais madura e menos erótica. Só que ela acaba não funcionando.
A Netflix segue firme acreditando na base de fãs de Elite e na força da série nas redes sociais. Com isso, entrega uma nova remessa de episódios sobre contos de advertência aos jovens e, dessa vez, com menos apelo sexual (a quinta temporada segue com o título de mais erótica).
Desde o lançamento da primeira temporada, Elite surgiu como um novo prazer culposo (guilty pleasure), o tipo de série que pega o público com elementos atrativos o suficiente para entregar um pouco de diversão boba e despretensiosa. Porém, desde sua
quarta temporada, o sentimento de prazer foi se perdendo e o de culpa foi aumentando, fazendo o público se questionar porquê ainda segue assistindo mais do mesmo.
A verdade é que essa festa virou um enterro há muito tempo. O motivo de continuar renovando a série, em detrimento de outras bem melhores, é a popularidade e o engajamento que tem nas redes sociais. Mas, uma série não se sustenta somente disso.
A sinopse oficial da sexta temporada diz que “Todo mundo está procurando por algo este ano em Las Encinas, seja amor, vingança ou milhões de seguidores. Mas todos eles conseguirão sair vivos?” E, após enfrentar uma maratona dos novos episódios, o público pode se perguntar se a produção não deveria procurar um sentido para sua existência. Uma série que não desperta mais nada além de tédio.
A nova temporada dá continuidade a algumas tramas enquanto introduz novos personagens e novas tramas. Igualmente, apresenta o mistério/crime da temporada. Um formato que já se desgastou.
Sendo essa a primeira temporada sem um membro do elenco original, cabe ao trio de irmãos Ari, Patrick e Mencia o papel de veteranos do Las Encinas. Mas quem carrega toda temporada acaba sendo Isadora (Valentina Zenere), Ivan (André Lamoglia) e Nico (Ander Puig), primeiro personagem transgênero do drama espanhol.
O retrato de uma juventude quebrada e autodestrutiva
Discutindo sobre homofobia, transfobia, justiça, racismo, o lado tóxico das redes sociais, relacionamento abusivo e, pasmem, castração química, os novos episódios carregam uma atmosfera diferente das temporadas anteriores.
Ari, Mencia e Patrick voltam para a escola depois que seu pai foi preso por suas transações financeiras e também pelo assassinato de Samuel. Patrick tem Ivan como apoio, mas o relacionamento deles nunca é tranquilo. Os dois vibram em frequências diferentes, vez ou outra se revezam no papel de sabotador do relacionamento. A química parece ser apenas sexual.
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Ari está cada vez mais autodestrutiva. Em parte por não saber lidar com o luto e a perda de Samuel, além de precisar tomar as rédeas da família. Além disso, acaba sendo gatilho para Nico, o jovem transgênero.
O que fazem com o personagem é um desserviço a comunidade trans, diante da temática proposta e dos caminhos que a trama percorre. Introduz o personagem com um discurso sobre normalidade, mas o roteiro a todo momento não o trata como uma pessoa normal. Igualmente, os personagens negros são constantemente lembrados por sua raça.
A série traz uma nova história de abuso, apresentando os novos personagens Sara (Carmen Arrufat) e Raul (Alex Pastrana), um casal de influenciadores digitais que carrega uma vida privada problemática e sombria. Curiosamente, Mencia assume o papel de Rebbeka na temporada anterior tentando salvar a colega de um relacionamento abusivo. O caso de estupro de Isadora ganha novos desdobramentos levando a personagem ao seu limite.
Elite permanece com seus exageros e a glamourização do comportamento distorcido da juventude. O uso compulsivo de drogas e álcool e cenas de sexo continuam. A escola se torna cada vez mais um cenário em segundo plano. Ninguém estuda e parece que não existe nenhum professor disponível para educar os filhos da elite da Espanha.
A série traz alguns contos de advertência sobre comportamentos destrutivos além de usar tudo isso para chocar o público como se fosse uma produção revolucionária e inovadora. No entanto, entrega tramas datadas e estereotipadas.
Vale a pena continuar assistindo Elite?
O roteiro permanece preso em uma fórmula que já não funciona mais. O mistério da temporada simplesmente não faz sentido e não serve de muita coisa. Mas uma vez soa desesperado criar situações somente para movimentar a trama. O caso até ganha desdobramentos surpreendentes no final, mas já é tarde pra tentar salvar alguma coisa.
Um dos muitos casos curiosos é a ausência da polícia e de uma investigação. Afinal, um jovem é atropelado na porta de uma boate gerenciada por uma aluna do ensino médio e o
motorista foge sem prestar socorro.
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Aliás, os alunos de Las Encinas sempre estão envolvidos em algum caso de polícia. Em uma narrativa mais crível, Las Encinas já estaria de portas fechadas.
A série continua apostando no que deu certo e chamou atenção do público: sequências no estilo de videoclipes mostrando uma juventude se expressando através do sexo, dança, álcool e drogas. Mas tudo é tão raso e vazio, que não desperta nada no público.
De modo geral, a atuação também fica muito a desejar. Valentina Zenere se esforça como Isadora, mas não entrega toda carga emocional que a personagem demanda.
Os personagens parecem viver na esperança de dias melhores que nunca virão. Não há no horizonte um sinal de tranquilidade, felicidade e normalidade para os alunos de Las Encinas.
E, quando um pequeno sinal ameaça surgir, a temporada encerra da mesma forma que a terceira temporada de Sintonia (também um original Netflix). Um tiroteio na escola e uma nova rivalidade entre duas famílias parece ser o tema central da sétima temporada já confirmada.
Novos temporada é um esforço inútil
É preciso reconhecer que a série se esforça para reacender o interesse do público e tudo aquilo que a tornou tão viciante e atraente em suas primeiras temporadas. Não há ambição ou propósito para esses personagens.
Somando-se a isso um roteiro fraco e mal estruturado, as chances de Elite parar de correr em círculos e caminhar em linha reta, são bem pequenas. Fica claro o desejo de seguir um caminho mais maduro, mas não há espaço para conversas profundas aqui.
Como sempre o roteiro aborda temas relevantes, mas na superficialidade de um pires. Com uma escrita sem brilho, não há nada que justifique a existência de mais uma temporada que
utiliza exaustivamente os mesmos recursos e apelos sem apresentar nada realmente novo e plausível.
Faltam diálogos honestos sobre como eles vivem e como chegaram a esse ponto de suas vidas. Não há um personagem ou conflito abordado que tente estabelecer uma conexão real com o público. A forma encontrada pelo roteiro é sempre impactar para causar.
Omar retorna para sétima temporada, e me pergunto que função ele terá, uma vez que em sua última participação ele apenas orbitou em volta dos outros personagens. Mas, diante dos acontecimentos dos novos episódios, parece que não há mais nada a ser mostrado. O maior mistério de Elite é saber se a série ainda terá algum interessado até a próxima temporada.
Nota: 2/5