Crítica: Inacreditável é drama poderoso, rico em detalhes e atuações primorosas

Forte e poderoso, Inacreditável tem tudo para ser um dos melhores dramas do ano, ao lado de Chernobyl e Olhos que Condenam.

Imagem: Netflix/divulgação

Inacreditável tem tudo para ser a sua próxima maratona, sendo um dos melhores dramas do ano!

A riqueza de uma produção, seja ela do tipo que for, geralmente se encontra nos detalhes. Dentre as séries de televisão, os detalhes vencem o teste do tempo e permanecem sendo debatidos com o passar dos anos. Até hoje, anos após sua estreia e desfecho, Breaking Bad segue sendo lembrada e discutida justamente por seus detalhes, que enriquecem o projeto a cada descoberta. Estes detalhes, aliados ao esmero na construção da narrativa e dos personagens, é que fazem Inacreditável (Unbeleivable), nova minissérie da Netflix, algo imperdível.

Na trama, uma jovem chama a polícia e presta depoimentos após ser estuprada em seu próprio apartamento. Depois de verbalizar o trauma sucessivamente, Marie, a vítima, pode finalmente retornar ao prédio onde reside com outros jovens desamparados. As investigações se desenrolam até que uma das mães adotivas de Marie entra em contato com os detetives e revela que a jovem pode estar inventando o caso para chamar atenção. A moça logo é desacreditada e levada a retirar o depoimento inicial, alegando, agora, que estava mentindo. O problema é que outras vítimas surgem em diferentes locais e sob a investigação de diferentes detetives. É aí que duas policiais, Grace e Karen, se unem para averiguar os assustadores incidentes.

Com oito episódios, a minissérie é um longo filme, perfeito para ser assistido de uma vez só

Ainda que estruturada em capítulos, a minissérie é praticamente um longo filme. Maratonar Inacreditável, portanto, será uma enorme facilidade, já que cada episódio se conecta ao seguinte, deixando o espectador curioso, ávido por mais tempo ao lado de personagens tão complexos. Unbelievable, aliás, se sai bem justamente ao não reter seus esforços apenas no desenvolvimento da vítima central ou das detetives. Tampouco se debruça apenas na investigação. Há, aqui, um enorme leque de personagens ricos e multifacetados.

Preste atenção em Karen, por exemplo, interpretada brilhantemente por Merritt Wever. Quando surge pela primeira vez, no segundo capítulo, conversando com uma vítima, Karen adota um tom de voz monocórdio. Adotando uma postura amigável e atenciosa, Karen faz da vítima o seu único foco enquanto dialogam. Aqui, vemos a total discrepância entre o trabalho cuidadoso e amistoso de Karen e a abordagem fria e distante dos policiais homens envolvidos no caso de Marie. A riqueza de Karen fica explícita, então, quando a vemos se relacionando com outras pessoas. Seja com colegas de trabalho ou com o marido, a detetive adota uma postura muito mais rígida, quase defensiva, além de impor a voz e a personalidade.

O mesmo acontece com Kaitlyn Dever, uma das melhores revelações de 2019. Marie não esconde o passado problemático, e sua fala e olhar indicam um histórico de dores e decepções. Ao ser encurralada, Marie começa a duvidar da própria sanidade, pois este é o caminho que sempre tomou com o passar dos anos. Acostumada a ser desacreditada e deixada de lado, Marie acha que o problema está nela e não no mundo. Não seria de se espantar, portanto, que o estupro fosse mais uma armadilha de sua mente e vida difícil. E Dever, atriz tão jovem, mas tão segura, lapidada, transmite a dor de sua personagem com exatidão. O trauma que sucede o crime, por exemplo, é dolorido, exibido sem amarras.

Roteiro e personagens são os focos principais, mas a minissérie não decepciona no quesito técnico

Inacreditável, contudo, não faz do estupro e do trauma uma válvula de entretenimento ou choque. O crime, aliás, é filmado com inteligência e cuidado por Lisa Cholodenko, cineasta que já havia garantido seu talento na TV com a excelente Olive Kitteridge, da HBO. A diretora sabe que a força do projeto reside nos personagens e no roteiro e, por isso, não rouba a atenção do público com experimentações visuais. Ainda assim, Inacreditável é tecnicamente irrepreensível, com destaque à já citada direção de Cholodenko e à brilhante edição.

Com oito episódios bem amarrados, Inacreditável é entretenimento de primeira grandeza. Mesmo que não constasse com todo o peso do comentário social, o projeto ainda mereceria aplausos, já que toda a trama da investigação é intrigante e bem executada. De todo modo, como comentamos anteriormente, são os detalhes que transformam a obra, impedindo que esta não seja apenas uma história sobre uma investigação criminal, mas um drama poderoso sobre a força, perseverança e empatia humana.

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Matheus Pereira

Jornalista, curioso e viciado em cultura. Escreve há quase 10 anos no Mix e Six Feet Under é sua série favorita.

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