Crítica: Pam & Tommy é história real mais estranha que a ficção

Pam & Tommy é a representação de seus personagens: louca, enérgica e multifacetada. Série explora os horrores da fama e do início da internet.

Pam & Tommy

A vida real fornece histórias absurdas o suficiente para que não precisemos criar ficções pelo resto da história da humanidade. Craig Gillespie sabe disso, pois já comandou Eu, Tonya nos Cinemas e agora chega à TV com Pam & Tommy. Muito mais que a história de uma fita íntima, a minissérie lançada no Brasil pela Star+ é uma interessante análise da fama e uma divertida e perspicaz meditação sobre o surgimento da internet e o poder da rede. Com três episódios já lançados, Pam & Tommy é uma ácida mistura de drama, comédia e os terrores de uma sociedade doente.

Na trama, uma equipe de trabalhadores faz a reforma da casa de Tommy Lee, baterista famoso da época, e Pamela Anderson, atriz que era sensação na já clássica S.O.S. Malibu. O problema é que Tommy é um lunático e, além das mudanças constantes, o comportamento agressivo torna a relação de trabalho cada vez pior. Ao expulsar os homens da casa, após um desentendimento, Lee, sem saber, enfrenta a fúria de Rand. Este é o carpinteiro da obra e, indignado, invade a mansão e rouba um cofre, na intenção de reaver o dinheiro investido no negócio.

No cofre haviam armas, dinheiro, miudezas, um biquíni e uma fita. A fita que mudou tudo.

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Primeiros episódios exploram o início do caos – e da internet

Os três primeiros capítulos funcionam como um filme de quase três horas que vão desde o início da divergência entre Tommy e Rand, passando pela história de como o música conheceu Pam e encerrando com o início do caos: a divulgação da sex tape. Bem estruturado, o roteiro entende que não é só Pamela Anderson que renderia uma boa história. Tampouco a fita é o grande centro das atenções. O texto, portanto, entende que Rand e seus comparsas também são figuras que merecem atenção. Com isso, o piloto foca mais em Rand e sua vida miserável, enquanto o segundo episódio esmiúça o relacionamento de Pamela e Tommy.

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O terceiro capítulo, por conseguinte, mescla a rotina do casal com as tentativas infrutíferas de Rand ao oferecer a fita a produtoras de filmes adultos. Aqui, Pam & Tommy chega a ser tocante, e é um erro assumir que a minissérie esteja se aproveitando da intimidade de Pamela ou do escândalo envolvendo o casal. Isso porque Pamela jamais é retratada como idiota ou fraca. Até mesmo Tommy, apesar das grosserias e loucuras, tem tempo de mostrar uma face humanizada. É Anderson, entretanto, que rouba o show. E ver suas tentativas de crescer enquanto atriz são legitimamente tocantes, pois percebemos que, ainda que ela queira crescer como mulher e profissional, os homens ao seu redor a veem como um pedaço de carne.

Lilly James se transforma em Pamela Anderson com atuação calculada

E a minissérie faz um ótimo trabalho ao dar vida a estes personagens tão estranhos quanto a ficção. Ainda que mostrem todos como desajustados, o roteiro e seus atores sempre buscam um nível de complexidade na caracterização. Desta forma, embora Tommy surja tendo uma conversa absurda no segundo episódio, ele também aparece apaixonado e preocupado com a esposa logo em seguida. Já Rand é a figura complicada interpretada com o bom humor habitual de Seth Rogen. A série jamais o trata como vilão, por ter divulgado a fita, mas também não o pinta como vítima. Derrotado em várias frentes de sua vida, o que começa como uma vingança justa termina em uma busca por dinheiro fácil e humilhação. Em sua mesquinharia, Rand não percebe que a maior vítima é aquela que não tinha nada a ver com a briga: Pamela.

E se há alguém garantido no próximo Emmy, este é Lilly James. A atriz se transforma em Pamela Anderson. Com auxílio de uma maquiagem impecável, James encarna a atriz como se este fosse o papel de sua vida. E talvez seja. Próteses realistas recriam cada detalhe de Anderson, desde a testa (sim, a testa é uma prótese), passando pelos dentes até os seios. James passou horas na cadeira de maquiagem para, então, ficar idêntica à original. Nada disso funcionaria sem a performance calculada de James, que captura os mínimos movimentos da boca e os tiques de Pamela. Da voz à expressão corporal, James conquista e surpreende dentro e fora das telas.

Pam & Tommy
Imagem: Divulgação.

Série é representação de seus personagens: louca, enérgica e multifacetada

Capturando a vibe dos anos 90 sem jamais se render a clichês ou exagerar na atmosfera, Pam & Tommy acaba acertando ao abraçar o absurdo, sem nunca perder o peso da história. Apesar de focar nos primórdios da internet, a série explora as maravilhas e os horrores da world wide web. Assim, é divertido ver Rand procurar por um objeto por dias até encontrá-lo na internet, em uma loja do outro lado do país. E o melhor: o vendedor afirmar que está adorando a internet, pois já é o terceiro cliente que chega à loja através do site. Apesar das possibilidades positivas, Pam & Tommy deve explorar os malefícios daquele que pode ter sido o primeiro viral online.

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Dirigida com energia por Craig Gillespie, a produção capricha nos aspectos técnicos para entregar uma história absurda na superfície, mas dramática e tensa em seu cerne. Com edição ágil e trilha sonora dançante, Pam & Tommy mostra que a verdade pode ser tão louca, engraçada e doída quanto a ficção. Entrando para a lista cada vez maior de grandes minisséries do último ano, Pam & Tommy chegou para polemizar, assim como seus personagens centrais.

Nota: 4/5

Sobre o autor

Matheus Pereira

Coordenação editorial

Matheus Pereira é Jornalista e mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Depois de quase seguir carreira na Arquitetura, enveredou para o campo da Comunicação, pelo qual sempre nutriu grande paixão. Escritor assíduo na época dos blogs, Matheus desenvolveu seus textos e conhecimentos em Cinema e TV numa experiência que já soma quase 15 anos. Destes, quase dez são dedicados ao Mix de Séries. No Mix, onde é redator desde 2014, já escreveu inúmeras resenhas, notícias, criou e desenvolveu colunas e aperfeiçoou seus conhecimentos televisivos. Sempre versando pelo senso crítico e pela riqueza da informação, já cobriu eventos, acompanha premiações, as notícias mais quentes e joga luz em nomes e produções que muitas vezes estão fora dos grandes holofotes. Além disso, trabalha há mais de dez anos no campo da comunicação e marketing educacional, sendo assessor de imprensa e publicidade em grandes escolas e instituições de ensino. Assim, se divide entre dois pilares que representam a sua carreira: de um lado, a educação; de outro, as séries de TV e o Cinema.