Crítica: Querido Edward simplifica temas e perde boa oportunidade
Querido Edward aborda a dor e o luto sem se arriscar. Sobram lágrimas, mas falta peso à história de um improvável sobrevivente.
A arte sempre foi uma das formas mais potentes de se discutir e entender o luto. Quadros foram pintados depois da perda de um grande amor. Livros foram escritos depois da despedida de um familiar. As pessoas encontram saídas para processar e aceitar uma dor tão grande. Alguns abraçam a religião, outros adotam vícios.
E uma porção se dirige à arte – seja criando ou consumindo. Querido Edward, nova série da Apple Tv+, é sobre dor e luto do início ao fim.
O programa, baseado no romance de Ann Napolitano, Querido Edward, acompanha o garoto do título, que acaba de sobreviver a uma tragédia inacreditável. O avião em que ele, sua família e mais uma centena de passageiros caiu. Todos à bordo morreram, menos ele. Edward sobrevive graças a uma porção de sorte e coincidências que fizeram com que ele saísse dos escombros com apenas arranhões.
História de Querido Edward vem de um livro de ficção baseado em incrível história real
Agora, sozinho no mundo e com uma dor que mal consegue entender, Eddie vai morar com a tia, interpretada por Taylor Schilling, de Orange is the New Black. O próprio Edward é a epítome do luto, muito embora tenha sobrevivido. Em vez de ser sinal de esperança e salvação, o menino é uma lembrança constante do avião e suas vítimas.
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Edward, seus familiares e todos os que conheciam as vítimas do voo devem viver com essa dicotomia. Todos estão felizes pela sua sobrevivência milagrosa, mas todos também estão despedaçados pelas várias perdas. O menino em si deve viver entre o agradecimento e o lamento. A felicidade de viver e a dor de ter perdido tudo e todos.
Falta coragem para tocar nas verdadeiras feridas
Querido Edward falha, entretanto, ao simplificar demais seus temas e personagens. Enquanto podia se tornar uma meditação do luto, algo que A Sete Palmos fez com brilhantismo absoluto na HBO, Querido Edward é mais como This is Us.
Melodramática demais e densa de menos, a estreia da Apple talvez tivesse medo de pesar a mão e afastar a audiência. Como numa receita, decidiu adoçar para que ninguém achasse amargo.
O problema é que é impossível contar uma história dessas sem abraçar a dor que ela rende. Com isso, ao optar por músicas pops e não por diálogos legítimos, o peso do problema se esvanece. Ainda assim, Schilling e Connie Britton, por exemplo, tem ótimas atuações.
A questão é que ninguém parece sofrer de verdade – ou querer sofrer. Assim, parece que Querido Edward é uma série de muitos “quases” e poucas apostas seguras.
Em Querido Edward, luto é muito confortável
O livro de Napolitano, por exemplo, também é açucarado, mas abraça o luto com muito mais coragem. No romance, entretanto, a estrutura é diferente.
Nas páginas, nos dividimos entre dois momentos: o pós-acidente, com Eddie tentando se adaptar à família da tia, e o voo que acabou em tragédia. Assim, quase que metade do livro se passa no avião, contando as histórias de vários passageiros antes da queda.
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Entende-se o objetivo e as escolhas da série. Seria complicado fazer uma série em que metade do tempo estaríamos presos a um avião. De todo modo, é interessante analisar essas diferenças e ver o quanto a série ganhou ou perdeu com a mudança.
No fim, Querido Edward envolve pelo bom ritmo, bons personagens e história. Ainda que perca a chance de criar um drama realmente poderoso, o programa tem bons momentos e pode se tornar uma “série-conforto” para muita gente. E talvez seja esse o problema: Dear Edward é muito confortável para o seu próprio bem.
Nota: 3/5