A inspiração dos anos 1980 contribuiu para o sucesso de Cobra Kai
Série resgata essência usada por filmes dos anos 1980 e se tornou sucesso.
Sucesso é comprovado por recordes recorde de visualizações
Ah, os anos 1980… Uma década inspiradora para o cinema. Isso é perceptível com o revival de muitas séries com o toque daquela época. Desde a magia dos filmes de Spielberg emulada por séries como Stranger Things até a reciclagem de antigos sucessos, como MacGyver e Lethal Weapon.
Apesar desta nostalgia ser gostosa de experienciar, noto que a maioria das novas séries não tocam no ponto mais importante que as (boas) produções daquela década tentava nos ensinar. Mas antes, uma pequena contextualização histórica que ocorria (lembrando que o cinema refletia, ou tentava refletir, a realidade histórica vivida).
O que fez dar certo nos anos 1980?
A Guerra do Vietnam tinha acabado em meados da década de 70. Os Estados Unidos havia perdido mais que um conflito armado: O país perdeu numerosos soldados e a confiança na administração pública. Os Estados Unidos era, segundo o americano médio, um país cheio de falhas e, talvez, o vilão da história.
Surge então, no final da década de 70 e início da de 80, filmes como Rocky e Rambo. Coincidentemente, ambos interpretados por Sylvester Stallone (um dos ícones mais marcantes da década de 80). E Ambos os filmes citados são importantíssimos para entender o volksgeist da cultura ocidental (esta palavra alemã significa, em tradução livre, o espírito do povo em um determinado período).
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Nós, como povo, como consciência coletiva, queríamos heróis, modelos a serem seguidos. Mas não queríamos heróis imortais ou com superpoderes. Ouvíamos contos de fadas já com certo cinismo e buscávamos heróis que falhavam, que voltavam para a casa com a notícia que haviam fracassado ou ganhado da pior maneira possível. Rocky e Rambo traduzem este sentimento muito bem. Isso porque enquanto o Rocky sempre achava a vitória na derrota, o Rambo sempre encontrava a derrota na vitória.
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E aí entra um certo filme…
Mas ainda havia espaço para heroísmo à moda antiga, o que explica o sucesso do filme Karatê Kid. A história de um menino inteiramente bom, que sofria nas mãos (literalmente) de um bando de meninos maus e, no final, consegue vencê-los em um campeonato de Karatê.
Mas esta história estava boa demais para ser verdade, não? Afinal, a vida não é assim. Apesar de se tornar um clássico, a historia do filme mais se assemelha a um conto de fadas do que uma história real de superação, realizada por serem humanos.
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E então resolveram produzir Cobra Kai. Uma série derivada do filme original de 1984 que reconta, ou continua, a história da melhor maneira possível. Assim, ela busca incluir naquela história original os elementos que estavam presentes nas melhores produções da década de 80: o cinismo e a quebra do maniqueísmo. Algo que ela não fez, lá em 1984.
A inversão do papel para contar a história é um dos ingredientes…
A série inverte o papel do personagem principal: se antes o herói era Daniel, agora o protagonista é Johnny. Com isso, ela dá uma mudança na moral da história. O personagem principal não é um bom moço, e sim um velho alcoólatra cheio de arrependimentos e dívidas que busca no Karatê não um meio de se defender, mas de se redimir. A vida de Johnny já passou e foi um fracasso. O que resta agora é a torcida para que ele consiga passar um pouco das boas coisas que aprendeu nestes anos aos novos alunos.
Os alunos também são destaque na história, pois Johnny era o causador do bullying quando jovem e agora ele ensina garotos e garotas que sofrem bullying a se defenderem. E esse é o seu caminho para a redenção.
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Além disso, o roteiro dá um nó adicional na história pessoal de Johnny ao fazer seus alunos enfrentarem seu filho em um campeonato esportivo semelhante ao do filme original. Seu próprio filho, com quem possui um relacionamento distante e frio, e é treinado por seu maior inimigo, Daniel. Sim, aquele mesmo do filme.
E na história de hoje, aprendemos…
Sem estragar o final, a premissa está montada: Se Johnny (e seus alunos) perde o campeonato, sua redenção não estará completa. Mas se ele ganhar, ganhará em cima de seu próprio filho, abalando ainda mais o relacionamento frágil dos dois. Não há saída fácil para nosso “herói”, assim com não havia saída fácil para nossos heróis da década de 80. E isso é uma nostalgia pura. Homenagem, ou não, esse resgate de uma fórmula oitentista é o que faz tudo ter sentido no final.
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Quando o campeonato começa, percebe-se na cara do Johnny, que ele também sabe disso: se vier a vitória, ela virá com a derrota. Esta é a verdadeira luta que está em jogo em Cobra Kai e, sinceramente, é a luta que mais queremos ver.
Sem piedades.