Round 6 fez $ 1 bilhão para Netflix e criador ganhou quase nada
Relatório do Los Angeles Times revelou que Netflix ganhou uma fortuna com Round 6, mas pouquíssimo foi repassado para o criador.
Mesmo que você não seja um assinante da Netflix, é provável que pelo menos esteja ciente da existência da série sul-coreana Round 6. Oficialmente, ela a série mais popular na história da plataforma. A história, aliás, é um tanto simples: a série de Hwang Dong-hyuk mostra cerca de 456 indivíduos participando de jogos infantis até a morte na esperança de que a vitória os tire da ruína financeira.
Dominando os tópicos de conversa em grande parte de 2021, a série fez história, recebendo 14 indicações ao Primetime Emmy Award e ganhando seis. Entre eles, a estrela Lee Jung-jae levou para casa a estátua de Melhor Ator em Série Dramática (a primeira vez que um ator asiático ganhou o prêmio por um papel em produção de fala não-inglesa).
Round 6 gerou muito dinheiro para a Netflix… mas somente para a Netflix
O thriller de sobrevivência que viciou o público teve um investimento da Netflix em cerca de US$ 2,4 milhões por episódio, o que é um investimento bem pequeno, se compararmos com uma série tipo Stranger Things (onde a 4ª temporada custou US$ 30 milhões por episódio).
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Mas o investimento valeu a pena. Isso porque, em relatório, o Los Angeles Times estimou que o sucesso do programa aumentou o valor da empresa em cerca de US$ 900 milhões. Com uma segunda temporada prometida, um spin-off reality show questionável, e toneladas de mercadorias licenciadas, pode-se supor que Hwang Dong-hyuk – a mente por trás da série, estaria com um cofre igual o Tio Patinhas. Mas este não é o caso. (via Slash Film)
Infelizmente, não há cofrinho de ouro para a equipe criativa por trás de Round 6, e sim para a Netflix que, de acordo com o Los Angeles Time, continuam lucrando com seu trabalho.
De acordo com a matéria do jornal, parte do contrato de Hwang incluía a perda de todos os direitos de propriedade intelectual e residuais sobre a marca. Embora alguns possam ficar do lado da Netflix sob o pretexto de “jogadas inteligentes” ou qualquer conselho financeiro falso que um apresentador de podcast esteja defendendo, renunciar a resíduos ou direitos de propriedade intelectual não é uma coisa boa no mundo dos negócios. É um comportamento predatório de uma gigante do entretenimento.
É (parcialmente) por isso que a Greve dos Roteiristas é importante
O Sindicado dos Roteiristas está caminhando para seu segundo mês de greve, após não conseguirem negociar um acordo adequado com os estúdios. Infelizmente, devido à cobertura indiscutivelmente distorcida motivada por interesses de estúdio, e uma falta geral de conhecimento de quanto a indústria mudou desde os dias anteriores à revolução do streaming, ainda há uma quantidade esmagadora de pessoas que não conseguem compreender por que a greve é importante.
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Um documento das propostas Sindicato e das ofertas dos estúdios está disponível online, mas um dos principais campos de batalha é lidar com os resíduos – algo que a Netflix fez com Round 6. Uma das demandas tem sido “estabelecer um residual baseado na audiência – além do residual fixo existente – para recompensar os programas com maior audiência“.
Em termos leigos, o Sindicato está pedindo para que os roteirista – ou criador – seja recompensado de forma justa pela programação de streaming, especialmente quando esses programas explodirem e se tornarem um fenômeno cultural.
Isso não apenas exigiria que os streamers liberassem os números de visualização de toda a sua biblioteca. Mas também significaria que os streamers não poderiam mais obter lucros exorbitantes sem compensar de forma justa que criou a série, primeiro lugar.
Atualmente, o cenário para os roteiristas é caótico. Alex O’Keefe, por exemplo, um dos roteiristas de The Bear (O Urso) no Hulu, aceitou o Prêmio do Sindicato dos Roteiristas de Melhor Série de Comédia tendo um saldo negativo na conta bancária. É por essas situações que o Sindicato vem lutado, e parece estar longe de encerrar essa luta.
Uma exploração do trabalho
Filmes e séries de TV da Coreia do Sul se tornaram uma “galinha dos ovos de ouro” para a Netflix. Com séries como “All Of Us Are Dead” e “Hellbound” explodindo em popularidade após o sucesso de Round 6. Considerando que a greve dos roteiristas não mostra sinais de terminar tão cedo, há uma grande probabilidade de que a Netflix dobre ainda mais projetos sul-coreanos, já que as produções internacionais geralmente não obedecem às regras Sindicato dos EUA. Mas, como relatou o Los Angeles Times, esses projetos geralmente só são possíveis por meio da “suposta exploração da força de trabalho do entretenimento sul-coreano”.
“Tudo se resume a custos trabalhistas“, disse Kim Ki-young, presidente do Broadcasting Staffs Union, que representa as equipes de produção. “Há uma quantidade impressionante de trabalho não pago sendo feito.”.
O LA Times entrou em contato com a Netflix para um comentário e recebeu uma declaração. “Pagamos preços justos e altamente competitivos com nossos criadores de K-Content e estabelecemos padrões claros para nossos parceiros de produção coreanos, que produzem todos os nossos shows e filmes.”
A declaração continuou: “Esses padrões atendem ou excedem a lei coreana”.
Tradução: “É incrível que as leis trabalhistas da Coreia do Sul sejam muito mais frouxas do que os padrões trabalhistas negociados em Hollywood. Graças aos sindicatos egoístas que não trabalham por migalhas.”.
As coisas têm que mudar
Este modelo atual é insustentável e antiético, e mudanças sérias precisam ser feitas. De acordo com o The Hollywood Reporter, o co-presidente-executivo da Netflix, Ted Sarandos, disse isso após uma recente visita à Coreia do Sul. “É importante para nós permanecer competitivos e promover um ecossistema saudável. E, no caso de sucesso de um programa, garantir que que os criadores sejam compensados de maneira correta na próxima temporada.”
Esta é uma boa declaração, mas certamente não ajuda ninguém que trabalhou na primeira temporada – e dada a propensão da Netflix para cancelar projetos com baixa audiência, as palavras de Sarandos oferecem pouco conforto.
Se há algum lado bom a ser encontrado, é que a Netflix manteve sua palavra quando se trata de Hwang Dong-hyuk. E todos os sinais apontam para um acordo lucrativo, mas somente para a 2ª temporada. O cineasta também é um defensor declarado de um projeto de lei que exigiria legalmente resíduos para criadores de filmes e TV. “Peço que olhem além do curto prazo e abordem isso como um passo para nutrir todo o ecossistema”, disse Hwang em um vídeo gravado entregue à Assembleia Nacional. “Para que haja o próximo Round 6 ou o próximo ‘Parasita’, os meios de subsistência dos criadores devem ser assegurados.”
A torcida é para que este cenário mude. Mas será que ele vai mesmo mudar?