The Crown: 6ª temporada Parte 1 se acovarda e perde grande chance

The Crown começa a sua última temporada de forma trôpega, pecando ao se acovardar diante de momentos cruciais da família real.

The Crown

O grande problema de Peter Morgan, criador de “The Crown”, é que ele respeita demais a Rainha Elizabeth e a família real. É perceptível na série, em entrevistas do roteirista e em outros de seus projetos que ele nutre uma profunda admiração e cuidado para com os membros da Coroa. Mas com Elizabeth o zelo é quase obsessivo. E isso acaba boicotando diversos momentos importantes do programa da Netflix.

Em linhas gerais, Morgan se acovarda e perde a chance de colocar o dedo na ferida não só da família, mas de toda a cultura que os envolve. Perde-se a oportunidade de discutir diversos fatores sociais e políticos, pois ninguém quer ofender reis, príncipes e parasitas da sociedade em geral. Isso acaba destruindo elementos da última temporada em especial, por pelo menos dois motivos: primeiro porque são os episódios que cobrem a história mais recente. O que nos leva ao 2º ponto: o que a série busca retratar já foi amplamente difundido entre um público que, em grande parte, presenciou e teorizou sobre tudo na época, ao vivo.

Série perde o balanço entre seus vários personagens

Morgan já havia discutido a morte de Diana com muito mais inteligência e criatividade em A Rainha, que deu o Oscar de Melhor Atriz para Helen Mirren. No filme, acompanhamos os dias seguintes à tragédia e como a família real reagiu aos acontecimentos. Mas mesmo naquele filme é perceptível um respeito desmedido pela figura de Elizabeth. No longa, todos os membros da família cometiam gafes e eram desprezíveis em algum momento da trama. Menos Elizabeth. Apesar de sua frieza e demora em reagir publicamente ao acidente, a monarca ainda é uma vítima das circunstâncias.

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A série parece seguir o mesmo rumo, e é uma pena que, pelo menos nesta primeira parte, alguns personagens importantes pouco ou nada apareçam. Entende-se que o foco, principalmente nestes capítulos, seja em Diana, Charles e Elizabeth. Ainda assim, parece que Morgan e sua equipe esqueceram totalmente dos outros elementos da narrativa. Política internacional? Primeiro Ministro? Conflitos? População britânica? Quase nada ganha espaço em um texto que não é ruim, mas parece distante do que um dia já foi.

Qualidade técnica segue irretocável

Mas a primeira parte da última temporada de “The Crown” não é um desastre completo. O elenco, em especial Dominic West e Elizabeth Debicki, é sempre um destaque. E é realmente uma pena que outros rostos não tenham a devida atenção. Além disso, Morgan é eficaz ao costurar grandes reviravoltas históricas com elementos aparentemente banais, como a introdução envolvendo dois fotógrafos no 2º episódio. “Two Photographs”, aliás, é um capítulo que funciona melhor que o primeiro, por exemplo. Isso porque a história leva o tempo necessário para ser contada, terminando antes da duração costumeira da série.

Nestes casos, quando parece empolgada com suas ideias e possibilidades narrativas, “The Crown” fica dinâmica, deixando para trás um de seus problemas mais antigos: a morosidade. A série está em sua última temporada, mas mantém a mesma calma de seu ano de estreia. Quem quer mais ação ou dramalhão, portanto, pode se decepcionar. Afinal, os capítulos finais não trairão o que foi feito até aqui.

Seguindo como um dos programas mais luxuosos da TV, “The Crown” investe em cenários, figurinos e detalhes que enriquecem o projeto. E a tarefa agora é ainda mais complexa, pois recriar os anos 1990 acaba sendo mais delicado do que os anos 1940 ou 1950, por exemplo. Afinal, temos lembranças mais vívidas do período, além de objetos, roupas, fotos próximos. Além disso, é uma época mais próxima, que divide mais similaridades com o presente. Ainda assim, “The Crown” se sai maravilhosamente bem, como sempre.

É uma pena que falte coragem no resto.

Nota: 3/5

Sobre o autor

Matheus Pereira

Coordenação editorial

Matheus Pereira é Jornalista e mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Depois de quase seguir carreira na Arquitetura, enveredou para o campo da Comunicação, pelo qual sempre nutriu grande paixão. Escritor assíduo na época dos blogs, Matheus desenvolveu seus textos e conhecimentos em Cinema e TV numa experiência que já soma quase 15 anos. Destes, quase dez são dedicados ao Mix de Séries. No Mix, onde é redator desde 2014, já escreveu inúmeras resenhas, notícias, criou e desenvolveu colunas e aperfeiçoou seus conhecimentos televisivos. Sempre versando pelo senso crítico e pela riqueza da informação, já cobriu eventos, acompanha premiações, as notícias mais quentes e joga luz em nomes e produções que muitas vezes estão fora dos grandes holofotes. Além disso, trabalha há mais de dez anos no campo da comunicação e marketing educacional, sendo assessor de imprensa e publicidade em grandes escolas e instituições de ensino. Assim, se divide entre dois pilares que representam a sua carreira: de um lado, a educação; de outro, as séries de TV e o Cinema.