Crítica: As Pequenas Coisas da Vida é uma série doce e amarga
As Pequenas Coisas da Vida é doce e amarga como a vida tem de ser. Série do Star Plus é emocionante e destaca trabalho de Kathryn Hahn.
Kathryn Hahn está de volta, e ela segue a linha dos papéis que abocanhou nos últimos anos. Sempre vivendo mulheres confusas ou excêntricas – por vezes hilária, Hann dominou um nicho que lhe rendeu ótimas atuações em tramas coesas e agradáveis, por vezes merecedoras de prêmios.
Foi assim em Mrs. Fletcher, mais recentemente Wandavision, e agora As Pequenas Coisas da Vida (Tiny Beautiful Things), nova série que chegou de forma exclusiva no Star Plus.
E a premissa da atração, aliás, em nada vende o potencial doce e amargo da vida que ela demonstra ao longo dos seus oito episódios.
Com base no livro de mesmo nome da autora Cheryl Strayed, As Pequenas Coisas da Vida conta a história de Claire (Kathryn Hahn), uma redatora que, logo à primeira vista, se mostra uma bagunça. Ela vive uma vida tumultuada, com o casamento falho e uma filha adolescente que basicamente a odeia.
Além disso, ela ainda carrega traumas do passado que envolve relacionamentos, traições e uma ligação com a mãe, a quem ela perdeu para um câncer. Diante desse cenário, e de forma relutante, ela se torna uma colunista anônima de sucesso conhecida apenas como “Doçura” (Dear Sugar).
Então, a história segue várias linhas do tempo, narrando sua vida cheia de obstáculos, humor e também beleza.
Trama demora a engrenar, mas se prende aos problemas reais
Logo de cara, a série tem um grave problema de realizar a conexão da protagonista com o público. O primeiro episódio joga algumas informações no ar, da forma que no segundo episódio a gente ainda não sabe o grande problema que vai ser conduzido pela história que se pretende contar.
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Mas, ao mesmo tempo, As Pequenas Coisas da Vida trabalha com o cenário de que a protagonista tem problemas reais. Seja um motorista de aplicativo que se torna uma transa que falha, seja o dilema sobre essa situação no dia seguinte que reflete sua vida amorosa bagunçada.
Ou ainda as questões envolvendo sua mãe, que quando mais nova foi a sua maior incentivadora. Mas que ela aprendeu nova a precisar enfrentar sua vida sem ela.
Se por um lado gastar dois episódios inteiros para explorar os problemas desconexos da protagonista pode ser um problema, ao mesmo tempo pode ser visto como uma grande base para definir que Clare está de fato quebrada. E é então que a série elucida ao público o ponto onde quer chegar.
Não tão boa com a vida, mas boa de conselhos
Se ela tem essa vida toda quebrada, em que posição ela ocupa para dar conselhos? Talvez seja isso, no entanto, que vai salvá-la.
À medida que As Pequenas Coisas da Vida avança, entendemos a a parte de escritora de Claire. Como que ela, ao longo de sua carreira chegou a ser desacreditada por editores, enquanto ela era a única que acreditava em si – além de sua mãe.
Isso, então, a fez se desacreditar, culminando em quando ela encontra um amigo que acredita no seu trabalho, e que precisa lutar para resgatar isso nela. Claire precisa voltar a acreditar em sua escrita, e mais ainda em si mesma. É sobre isso que As Pequenas Coisas da Vida trata.
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Em meio a um furacão que passa em sua vida, ela precisa aconselhar os outros. E esses conselhos são os que a leva refletir sobre tudo o que aconteceu consigo até ali. Ela tem uma adolescente dentro de casa que a odeia, ela tem um casamento fracassado, e trabalha em um local que cuida de idosos que definitivamente a afastou de onde ela imaginava que sua vida a levaria.
Todos esses percalços, aliás, servem para explorar as múltiplas facetas de Kathryn Hann, que tem muito de suas atuações enraizada no humor. O humor está até presente, mas ela se mostra versátil com todo o material, que a leva do momento de fúria, para a tristeza até chegar na ironia.
As Pequenas Coisas da Vida envolve e é certeira
Sob a supervisão de Liz Tigelaar, a mesma responsável por Little Fires Everywhere, a série é realmente surpreendente. Tanto pela sinopse quanto pelo trailer, a ideia – para quem não leu nada relacionado ao material base – é de que as cartas e os conselhos de Clare sejam os motores da série. Mas o engano vem aí!
As Pequenas Coisas da Vida é movida pela dor da protagonista ao longo dos anos, e como isso a impactou por toda sua vida. E a história não fica presa apenas no fracasso. Embora não mostre claramente, ou culmine em um final feliz, ela mostra como a superação é importante.
Além disso, como é possível encontrar a superação onde menos se espera. Não é necessário um final feliz para uma história que ainda não acabou. Mas é necessário uma superação para aquele que se sente fracassado ou sem rumo.
Há uma ironia na qual Claire começa a responder pessoas que ela nem conhece, e que de certa forma ela ajuda essas pessoas com palavras que ela mesma precisa ouvir. Tudo vem do coração dela. Teriam essas mesmas palavras, em determinados momentos de sua vida, feito a diferença?
Se existe um problema de narração em certo ponto da série, onde a trama dela mais jovem soa desconexa tanto com o presente quanto as cartas, isso se torna irrelevante. São detalhes únicos que não estragam a experiência de viver os altos e baixos da vida de Claire, a ponto de torcermos que ela encontre a tão desejada superação.
Como ela mesmo diz na série, e que talvez seja a grande lição da trama: “Curar é algo pequeno e simples. E é apenas uma única coisa: É fazer o impossível todos os dias”.
As Pequenas Coisas da Vida está disponível no Star Plus.
Nota: 4.5/5