The Handmaid’s Tale: 2ª temporada é maior, melhor e absolutamente imperdível
Segunda temporada retorna corrigindo pequenos detalhes e melhorando as já impressionantes qualidades do primeiro ano.
ATENÇÃO: ESTE TEXTO CONTÉM SPOILERS DA SEGUNDA TEMPORADA DE THE HANDMAIDS TALE!
Faltava muito pouco para que The Handmaid’s Tale fosse impecável em sua primeira temporada. Apesar da inquestionável qualidade técnica e narrativa, a série original da Hulu carecia de um ritmo regular e deixava de desenvolver algumas ótimas ideias, pecando particularmente ao não se aprofundar no início do problema, quando o regime de Gilead tomou conta do país. É com alívio, portanto, que presenciei um retorno primoroso do programa nos dois primeiros capítulos de sua segunda temporada.
Os pequenos detalhes que impediam The Handmaid’s Tale de alçar voos mais altos foram corrigidos e, pelo que podemos ver, o show voltou maior, melhor e absolutamente imperdível.
Escala aumenta…
Maior porque visivelmente a produção tem mais dinheiro em mãos para ser realizada. As maiores provas estão na grandiosidade de algumas sequências, repletas de figurantes, e no visual, que fica ainda mais cinematográfico. O roteiro arrisca e as cenas compensam e seguem as grandes ideias do texto: vemos, com maior precisão, os primeiros dias de Gilead nos Estados Unidos.
Temos, portanto, uma angustiante cena em um aeroporto, enquanto Emily (Alexis Bledel), ao lado da esposa e do filho, tenta sair do país antes que a ditadura teocrática se inicie oficialmente. São minutos construídos com base no suspense e na claustrofobia: diversas pessoas se amontoam nos salões do aeroporto tentando escapar, enquanto soldados vestidos de preto usam da violência para implantar a nova lei.
A cena, aliada a outras que mostram os perigos em reportagens na TV, pessoas que conversam entre si sobre o novo regime e corpos que surgem à luz do dia no meio da rua, dão o tom apocalíptico à temporada em uma escala grandiosa que faltava ao primeiro ano. Ao investir nestes flashbacks, The Handmaid’s Tale aumenta o drama do “presente”, quando vemos as personagens jogadas em universo sem esperança.
Trágico, porém magnífico!
O tom trágico aumenta consideravelmente e a audiência tem noção da magnitude do problema. Sabíamos que a trama se desenrolava em uma distopia, mas agora temos um olhar mais apurado sobre isso: vemos estradas desertas, campos imensos sem qualquer tipo de vida e prédios abandonados, como a redação do Boston Globe, onde June/Offred (Elisabeth Moss) fica escondida no segundo episódio.
É curioso, portanto, que June se esconda na redação de um jornal, veículo jornalístico livre e dedicado à verdade e à diversidade. Assim, é triste, ao final do segundo capítulo, vermos a personagem recolher diversos objetos pessoais das pessoas que trabalhavam na redação do jornal. Ela coleta canecas, potes, sapatos e pequenos souvenirs deixados para trás quando todos tiveram de fugir, temendo por suas vidas. Handmaid’s Tale começa, então, o caminho natural das produções que fazem grande sucesso em sua estreia: crescer em escopo e qualidade.
Explorando mais personagens!
Passo a entender, assim, o tom mais contido do primeiro ano: focado em menos personagens e ambientes, a série era o que a protagonista via, basicamente. Agora, quando foge e torna-se “livre”, como ela mesma afirma no desfecho do primeiro capítulo, June vê mais e conhece mais. A audiência, que segue ao seu lado, passa também a saber mais.
Mas não se engane: Handmaid’s Tale não é uma série apenas de June. Assim, o segundo episódio revela-se brilhante ao debruçar-se sobre a história de Emily, em uma atuação irretocável de Bledel. Ainda que dedique alguns minutos a June, a segunda hora desta nova temporada é quase toda da complexa personagem. Jogada nas colônias, onde é uma escrava, Emily vê o mundo e as parceiras desabarem ao seu redor enquanto ela mesma luta para se manter em pé.
É com a jovem que visitamos o passado em vários flashbacks, incluindo o do aeroporto. Vemos aqui a construção e o desenvolvimento delicado de uma personagem graças ao trabalho cuidadoso do roteiro e a dedicação intensa da atriz.
Emily realmente era casada com outra mulher e tinha um filho. Era professora e desfrutava de uma boa estabilidade em sua recente vida adulta. Além de todas as atividades, Emily ainda era uma mulher que lutava pelo espaço feminino dentro e fora do ambiente de trabalho, e a cena onde ela repreende um jovem rapaz e encoraja uma moça é linda em sua simplicidade e valor. Atriz e personagem roubam a cena, provando que poderiam facilmente protagonizar a trama ao lado de Moss.
Quem também segue roubando cenas é Ann Dowd: sua Aunt Lydia retorna implacável, mas mais humana e, com isso, mais interessante e complexa. É mais uma vez através de uma cena simples que a série revela sua força: depois de realizar mais uma sessão de tortura física e psicológica nas aias, Lydia se dirige a uma sala e, antes de entrar, chora. Não fica claro o motivo das lágrimas: estaria chorando por não mais aguentar o papel de torturadora vilã ou apenas emocionada justamente por gostar de seu ofício? Ao tocar o sino do retiro onde se encontram, Lydia se revela triste e desolada ou em pleno regozijo?
Qualidade técnica retorna também de forma excelente!
Estes momentos simples, mas impactantes, funcionam em grande parte graças à direção impecável de Mike Barker. O diretor extrai as melhor nuances das atuações de seu elenco, e atinge momentos que vão da tensão até a consternação. Barker não só é ótimo no comando de atores, ele sabe como filmar. Sua câmera capta algumas das imagens mais belas não só da série, mas da televisão recente. Amparado pela majestosa fotografia, Barker cria planos que merecem ser impressos e pendurados como quadros na parede. A plasticidade de suas composições enchem os olhos e servem à narrativa. Assim, não será espanto caso seja indicado ao próximo Emmy de Direção, sendo desde já um de meus favoritos ao prêmio.
Nas sequências que se passam nos campos das colônias, Barker filma sua personagens de cima para baixo, diminuindo-as na tela. Em momentos de discussão, como aquele envolvendo June e Nick, o diretor aposta em planos fechados e longos, com câmera na mão que ressalta a gravidade e a urgência do momento. Em outro ponto, revela June deitada em uma maca, prestes a ser examinada. Do outro lado de um pano branco surge a silhueta de Serena, como uma ameaça fantasmagórica. E o que dizer dos primeiros minutos do episódio de estreia, quando acompanhamos June em uma van e depois em uma estádio deserto, onde sobe em um palanque para ser enforcada ao lado de diversas outras mulheres?
Série deverá manter o posto de melhor do ano?
The Handmaid’s Tale retorna corrigindo pequenos problemas e melhorando ainda mais as impressionantes qualidades de sua primeira temporada. Investindo pesado em trilha sonora, fotografia e escala, o segundo ano já nasce épico, e pronto para crescer ainda mais.
Os rumos, pelo que vimos ao fim do segundo capítulo, são excitantes: June parece no controle de suas decisões, mas antes de se salvar, deseja ir ao norte do país, onde pode encontra a filha. Nick parece disposto a ajudar, mas até que ponto podemos confiar em sua boa vontade? Serena e Fred parecem dispostos a tudo para encontrar June e o bebê que carrega. Emily parece sem perspectiva, mas claramente planeja algo, principalmente após a chegada de Janine às colônias.
O caminho está se desenhando e, ao que parece, a jornada será inesquecível!