Crítica: 3ª temporada de Designated Survivor na Netflix merece o seu voto
Na sua terceira temporada, Designated Survivor usa e abusa da sua nova liberdade criativa e acerta na mensagem e nas ideias.
Designated Survivor retorna de forma revigorada na Netflix
Quando a ABC anunciou o cancelamento há pouco mais de um ano de Designated Survivor, confesso que concordei com os argumentos do canal. Seja criativamente (troca fervorosa de showrunners) ou economicamente (a audiência estava em frangalhos), e mesmo sendo responsável por escrever as reviews aqui no Mix de Séries, eles tinham razão. Contudo, quando a Netflix anunciou que traria o drama para mais um ano fiquei esperançoso com a promessa de mais liberdade criativa, propostas ousadas e um orçamento significantemente maior daquele que a ABC oferecia. Após assistir esses dez primeiros episódios, acredito que, assim como qualquer outro candidato de qualidade, há propostas não cumpridas. Mas um sentimento geral de acerto, qualidade e boas decisões.
A terceira temporada começa com o presidente Kirkman anunciado sua campanha à reeleição. É claro que tecnicamente seria sua primeira eleição, mas se vocês estão aqui é porque assistiram ao pomposo episódio piloto. O problema é que ele não concorrerá como Democrata ou Republicano e sim como um Independente, o que nunca deu certo em toda a história dos Estados Unidos. Por trás desse sonho quase utópico, precisa-se governar. Consertar a péssima infraestrutura; diminuir o custo de medicamentos controlados; revitalizar os grandes centros urbanos e evitar uma crise nuclear com a Rússia. Ou seja: um dia normal.
Precisamos conversar sobre verossimilhança
Observando de fora é realmente uma proposta interessante. Contudo, a forma na qual escolheram desenvolver todas essas questões foi desanimadora, frustrante e de um amadorismo impressionante. Chame-me de chato, mas acredito ser extremamente importante para uma série que tenta ser a nova versão de The West Wing, fazer direito. É necessário, inclusive, para educar o telespectador sobre como a burocracia de Washington D.C. funciona. Como que o roteiro quer tratar da crise de opioides e da diminuição do preço de remédios controlados sem que o Secretário de Saúde e Serviços Humanos apareça?
Há uma ótima narrativa no final da terceira temporada sobre um quase confronto militar entre os Estados Unidos e Rússia. A direção do episódio é excepcional em capturar o momento e transmitir a empolgação para o telespectador. Mas em nenhum momento vimos o Secretário de Estado, de Defesa ou de Segurança Nacional. Será que eles querem que o telespectador acredite que o conselheiro de Segurança Nacional é quem comanda todas as decisões? Acredito que esse desapego com o mundo real é um dos maiores defeitos desta temporada. É preciso que essa questão corrigida caso tenhamos uma quarta temporada.
Vamos falar de política?
Tenho que confessar com o leitor que eu sou um nerd propriamente dito no que se refere a política americana. Adoro. Poderia ficar horas lendo e relendo análises de eleições anteriores. Sendo assim, é possível entender meu gosto por House of Cards, Veep e The West Wing. Mas eu também sei que esse gosto não é compartilhado por grande parte da audiência. Sendo necessário uma maior disposição do roteiro em explicar, haja vista que estamos falando de um produto para o mercado internacional, como funciona o colégio eleitoral; o que é gerrymandering; o porquê é tão difícil ver um independente sendo eleito; que diabos é o Hatch Act e quais as consequências para servidores públicos. Posso passar horas apontando os furos.
Em contra posição foi um alívio ver esses personagens falando palavrão. Que grata surpresa termos dois personagens negros e gays falando sobre AIDS e PreP. E que sorte a nossa termos um roteiro tão disposto a tratar de questões atuais e polêmicas. Designated Survivor usou e abusou da sua liberdade nesses dez episódios. Sorte a nossa. Tratou de forma didática do porquê o país continua tão dividido em questões como direitos das minorias e imigração. Acredito que o cônsul e a consulesa da França, se não estou enganado nos títulos, nos representaram quando questionaram a dubiedade dos Estados Unidos no que se refere a questões básicas de direitos humanos.
Permitam-me filosofar
Quando terminei de assistir a temporada no último sábado (08), demorei para dar início a esta resenha porque precisava pensar no que acabara de ver. Acredito que os Estados Unidos do Presidente Kirkman é a visão dos roteiristas sobre a América pós-Donald Trump. A dificuldade do Congresso em aprovar questões populares como infraestrutura, ou o cinismo em politizar a vida de crianças e até mesmo o baixíssimo nível na qual se lida com direitos civis. A mensagem que fica é da necessidade de união, de diálogo e que o (tão esquecido) centro faça alguma coisa para acabar com a polarização que tanto nos separa.
Sendo assim, acredito que a terceira temporada de Designated Survivor tem muitos problemas no que se refere a atenção aos detalhes. Contudo, é um excelente entretenimento para quem busca aprender um pouquinho mais sobre o sistema político americano; ação nas alturas graças a Maggie Q e uma ótima reflexão sobre o sistema. Espero que estar novamente aqui em 2020 para comentar sobre uma possível quarta temporada.