Crítica: Gatunas, série da Netflix, dá exemplo de como contar uma boa história

Crítica da primeira temporada de Gatunas, nova série da Netflix.

Gatunas alcança bem os objetivos ao contar sua trama

Gatunas (Trinkets) é a nova série da Netflix. E, em meio a tantos lançamentos semanais, nos quais a plataforma acaba se perdendo na briga por lançar mais e mais títulos, a trama criada por Kristen Smith não é algo extremamente destacável. Também não será o tipo de série que todos vão comentar, discutir, ou achar uma das melhores da plataforma. Entretanto, Gatunas cumpre bem seu objetivo de entreter. E em tempos como hoje, no qual a Netflix se preocupa com a quantidade mais do que tudo, sem dúvidas é um positivo sinal.

A trama acompanha três garotas, Elodie (Brianna Hildebrand), Moe (Kiana Madeira) e Tabitha (Quintessa Swindell). Elas têm personalidades completamente diferentes, mas são unidas por um hábito em comum: a de furtar coisas em shopping. E por mais que houvesse algo ríspido entre elas, mais um confronto de ego do que tudo, elas acabam encontrando uma nas outras um conforto por ter algo diferente dentro de si. 

Gatunas acerta em colocar as protagonistas com essências completamente diferentes. Elodie é a garota lésbica, que não se vê seu mundo encaixado no dos colegas de classe. Moe é a punk que não liga muito para as regras, é dona de uma personalidade forte. Já Tabitha é a “pobre menina rica” da história, vindo de uma família com boas condições financeiras – mas com carga emocional o suficiente para um bom drama. Essa diferença se torna essencial quando a série em si deixa de lado o pano de fundo envolvendo o problema com os roubos, e passa a discutir os sentimentos internos das três garotas. E isso, definitivamente, passa a ser acerto.

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Buscando quem elas querem ser

Logo no primeiro episódio, a série passa uma mensagem bem interessante para o público. A primeira regra de roubar é ser invisível. Entretanto, logo em seguida, ela faz um questionamento: Mas não estamos fazendo isso o tempo todo? Ao explicar essa metáfora, a série deixa claro o discurso que pretende passar com suas histórias. As garotas estão ali para mostrar que, mesmo involuntariamente, estamos sempre buscando a aprovação do mundo exterior. É como se filtrássemos a vida com base nas ideias do outros, sobre quem precisamos ser.

Desse modo, a amizade das meninas traz um propósito que precisamos tomar para nossas vidas. A de que na vida, é necessário encontrar pessoas que nos enxergam sem esforços. São esses indivíduos que precisam ser olhados com a mesma reciprocidade, a fim de se manter perto aquela pessoa que gosta por quem realmente você é.

A trama de Elodie, talvez, é a que mais dá entonação esse viés. O fato dela ser virgem e gay coloca a personagem no centro de um turbilhão de emoções. Bem como, na necessidade de estar tentando a aprovação dos pais e de amigos. Ela ainda acresce do fato de ter uma limitação na exploração de sua sexualidade, uma vez que a garota na qual ela é apaixonada não dá a mínima condição para ela. Os dilemas, aqui, passam a crescer em cada novo episódio.

Agressão

Gatunas também acerta em um outro aspecto extremamente necessário para uma trama que se propõem a abordar a perspectiva adolescente. A de como a relação com os pais, em certo modo conflituosa, pode refletir no comportamento e na vida do adolescente.

Tabitha, sem dúvidas, se destaca entre as três por conta disso. Ela inicialmente tem a vida perfeita com os pais, mas vê tudo desmoronar ao descobrir que o pai trai sua mãe, mantendo uma vida dupla. Além disso, ela precisa lidar com o fato de que namora um dos meninos mais cobiçados da escola. Jogador de futebol, estrela do time, e extremamente popular. Entretanto, que tem uma personalidade agressiva, causando-lhe um abuso em muitos aspectos. E, mesmo sem aprofundar tanto, afinal cada episódio é construído com apenas 25 minutos, ela consegue passar uma mensagem de empoderamento, que ao meu ver é necessário.

Sem dúvidas, séries como Gatunas tem um poder de alcance incrível. E na mesma proporção em que ela pode causar um mal estar – como é o caso de 13 Reasons Why, ela também pode fazer o bem. A trama da personagem serve, assim, para mostrar que abusos podem ser impedidos. E que sempre haverá alguém para lhe apoiar em denúncias, bem como no processo de se livrar da prática.

Protagonistas cumprem bem o papel em Gatunas. Imagem: Netflix/Divulgação

Falando na falta de aprofundamento…

Existe um respaldo para que a série não tenha o seu roteiro raso, em alguns momentos, como a sua característica principal. Isso porque, mesmo o fato dela largar algumas tramas e voltar nela – episódios depois – sem o mesmo apelo, não tira o brilho do recado que ela deseja passar.

Olhando sob a ótica de que se trata de uma série de adolescentes, que se tornam aliadas de uma forma controversa, Gatunas se mostra uma série extremamente sólida. Ela possui qualidades que se sobressaem, apagando qualquer que seja seus problemas de construção ou narrativas. Assim, é uma série que não se torna cansativa, mesmo não sendo direta. Em alguns pontos, até lembra Sex Education – apesar dela ser bastante inferir à esta. Mas isso é um ponto positivo. É mais comedida, calma, mas se esforça em explorar mensagens que precisam ser discutidas e exaltadas em séries de TV – principalmente nas de alcance tão grande quanto as da Netflix.

Maratona válida

Há algo confortável em assistir Gatunas. Agradável. Uma história suave, rápida, que dá para ser assistida em uma tarde. Uma trama que mostra que a amizade, em certos níveis – e quanto lhe faz bem, é muito importante. No final da série, há uma cena das personagens em uma ponte, que dá a simbologia exata sobre o que é esta jornada. Para Elodie, naquele ponto, ter alguém próxima dela neste lugar é o que importa.

E não faz diferença se há furos de roteiro, ou inconsistência de tramas no caminho. Todos esses elementos se tornarão algo que poderão ser enfiados em uma bolsa, como se fosse objetos furtados de um shopping. E mesmo que ninguém sinta falta dessa série, em algum momento, ela cumpriu seu propósito: de trazer ao público ensinamentos relevantes.

Gatunas, sem dúvidas, é uma excelente maratona que vale a pena encarar. Afinal, todos nós precisamos de vez em quando assistir uma série sem compromisso. Fica assim a nossa dica…

https://www.youtube.com/watch?v=vlKloImQrUU&t=3s

 

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Sobre o autor

Anderson Narciso

Editor-chefe

Criador do Mix de Séries, atua hoje como redator e editor chefe do portal que está no ar desde 2014. Autor na internet desde 2011, passou pelos portais Tele Séries e Box de Séries, antes de criar o Mix. Formado em História pela UFJF e Mestre em História da Saúde pela Fiocruz/RJ, Anderson Narciso se aventurou no mundo da criação de conteúdo para Internet há 15 anos, onde passou a estudar sobre Google, SEO e outras técnicas de produção para web. É também certificado em Gestão Completa de Redes Sociais pela E-Dialog Comunicação Digital, além de estudar a prática de Growth Hack desde 2018, em que é certificado. Com o crescimento do site, e sua parceria com o portal UOL, passou a atuar na cobertura jornalística, realizando entrevistas nacionais e internacionais, cobertura de eventos para as redes sociais do Mix de Séries, entre outros. Atua como repórter no Rio de Janeiro e São Paulo, e pelo Mix já cobriu eventos como CCXP, Rock in Rio, além de ser convidados para coberturas e entrevistas presenciais nos Estúdios Globo, Netflix, Prime Vídeo, entre outros. No Mix de Séries, com experiência de dez anos, se especializou no nicho de séries e filmes. Hoje, como editor chefe, é o responsável por eleger as pautas diárias do portal, escolhendo os temas mais relevantes que ganham destaque tanto nas notícias quanto nas matérias especiais e críticas. Também atua como mediador entre a equipe, que está espalhada por todo o Brasil. Atuante no portal Mix de Séries diariamente, também atende trabalhos solicitados envolvendo crescimento de redes sociais, produção de textos para internet e web writing voltado para todos os nichos.