Crítica: Irma Vep, da HBO, analisa os bastidores da TV e do Cinema

Irma Vep, da HBO, faz piada e discute elementos vitais da indústria atual. Dos heróis aos atores, nada escapa do roteiro de Oliver Assayas.

O Cinema e a TV estão acostumados a meditar sobre suas idiossincrasias. Na verdade, a indústria adora olhar para o próprio umbigo. Não é à toa, portanto, que alguns dos títulos favoritos da crítica e das premiações sejam justamente aqueles que desvelam eras e rostos de filmes passados.

Neste sentido, as obras metalinguísticas ou referenciais formam quase um subgênero único. Irma Vep, que chega à HBO com pompa de “cult“, tenta entender as engrenagens do Cinema, da televisão e da arte como um todo, entregando uma mistura de drama e comédia que busca contemplar as belezas e feiuras do showbusiness.

Comandada pelo renomado cineasta Oliver Assayas, a minissérie Irma Vep é, em si, uma interpretação de si mesma. Para quem não conhece, o título surgiu em 1996, quando o diretor lançou um filme com trama semelhante a da adaptação da HBO. No filme, assim como na minissérie, uma atriz mergulha no desenvolvimento de uma personagem e acaba se confundindo entre realidade e ficção.

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A diferença, agora, é que Assayas torna o projeto mais complexo, como se fosse uma nova camada de uma boneca russa. Desta forma, Irma Vep é uma espécie de remake/continuação que jamais quer se categorizar. Em seu roteiro, acaba brincando com o próprio fato de que a moda, agora, são as séries, e que o que vemos não é uma série, mas “um filme em capítulos”.

Crítica: Irma Vep, da HBO, analisa os bastidores da TV e do Cinema

Irma Vep debocha e discute diversos elementos da indústria moderna: dos heróis ao vício pela TV

Afinal, a minissérie da HBO, dividida em oito episódios, acaba usando elementos reais para costurar sua tapeçaria. Assim, aqui e ali, o roteirista/diretor insere elementos de sua vida pessoal na trama do programa. Com isso, vemos aqui um artista fitando a própria carreira, e os temperos verídicos que permeiam a carpintaria de sua filmografia. Assayas, entretanto, não quer olhar apenas para o passado. Desta forma, com frescor e inteligência, faz paralelos pertinentes sobre a indústria atual.

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Logo, é sintomático que Mira seja uma atriz do alto-escalão americano e que venha de enormes produções, ao estilo Marvel. Desacreditada em sua arte e ferida no âmbito particular, Mira quer testar novos horizontes. Por isso, aceita participar de uma série que é remake de outra série, esta muda e em preto-e-branco. Trata-se de um projeto de prestígio, quase de nicho, e que pode colocar a atriz em outros mapas da indústria.

Nesta perspectiva, a própria Irma Vep é a minissérie “cult” que tenta espaço na grande galeria televisiva moderna. E não deixa de ser surpreendente, portanto, que o projeto esteja ganhando notória atenção, principalmente em uma época de megassucessos como Stranger Things e Obi-Wan Kenobi.

Alicia Vikander brilha em mistura intensa de drama, comédia e sensualidade

Irma Vep acompanha, então, a tumultuada produção da minissérie fictícia. Nos bastidores, um diretor volátil e inseguro não consegue transpor sua visão sequer aos mais próximos da equipe. No elenco, atores dividem intrigas e ansiedades que podem atrapalhar o processo. Soma-se a isso os problemas pessoais de cada um e o dramalhão está completo.

Nas mãos de Assayas, entretanto, o drama novelesco vira algo sutil, trabalhado com delicadeza e paciência. É uma abordagem, aliás, que pode afastar os mais afoitos, impedindo que uma audiência mais casual avance nos próximos capítulos da trama.

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Ao fazer piada de uma indústria que claramente se superestima – e não enxerga que a piada são eles próprios -, Irma Vep faz um retrato sincero de uma atriz que deseja crescer e se transformar. Para isso, precisa enfrentar colegas que não respeitam a profissão ou jornalistas que a veem como objeto.

Nesta perspectiva, Alicia Vikander é um destaque absoluto, já que interpreta Mira com um misto de desilusão e esperança inocentes. É uma mistura que se estende à sua vida pessoal, diga-se de passagem, já que enfrenta um mau momento com sua ex-companheira.

O maior problema de Irma Vep, entretanto, talvez seja a dependência de intertextos. É preciso conhecer e/ou se interessar pela indústria televisiva e cinematográfica para embarcar na diversão. Mais do que isso, é interessante se ter conhecimento prévio da filmografia de Assayas, um diretor que, convenhamos, está longe do grande-público.

Assim, Irma Vep tem uma curiosíssima semelhança com os títulos da Marvel. Assim como Doutor Estranho 2 ou Thor 4, é preciso ter um vasto conhecimento prévio de outras obras para apreciá-la em sua completude. No fim, pode ser que Irma Vep seja uma ilha, bela, mas isolada em seu refúgio.

Nota: 4/5

Sobre o autor

Matheus Pereira

Coordenação editorial

Matheus Pereira é Jornalista e mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Depois de quase seguir carreira na Arquitetura, enveredou para o campo da Comunicação, pelo qual sempre nutriu grande paixão. Escritor assíduo na época dos blogs, Matheus desenvolveu seus textos e conhecimentos em Cinema e TV numa experiência que já soma quase 15 anos. Destes, quase dez são dedicados ao Mix de Séries. No Mix, onde é redator desde 2014, já escreveu inúmeras resenhas, notícias, criou e desenvolveu colunas e aperfeiçoou seus conhecimentos televisivos. Sempre versando pelo senso crítico e pela riqueza da informação, já cobriu eventos, acompanha premiações, as notícias mais quentes e joga luz em nomes e produções que muitas vezes estão fora dos grandes holofotes. Além disso, trabalha há mais de dez anos no campo da comunicação e marketing educacional, sendo assessor de imprensa e publicidade em grandes escolas e instituições de ensino. Assim, se divide entre dois pilares que representam a sua carreira: de um lado, a educação; de outro, as séries de TV e o Cinema.