Escândalo em Hollywood: Globo de Ouro é cancelado

Netflix, Warner, NBC, Tom Cruise e toda a indústria acabam de cancelar o Globo de Ouro. Escândalo em Hollywood promete mudanças severas.

Globo de Ouro

Não é de hoje que o Globo de Ouro é conhecido pelos escândalos e péssimas escolhas. O próprio Mix de Séries já havia chamado atenção para os problemas da premiação em algumas ocasiões, bem antes da polêmica que tem tomado conta de Hollywood. Acontece que agora, anos depois de uma série irrefutável de erros e crimes, a indústria resolve cancelar o Globo de Ouro e sua organização, a Hollywood Foreign Press Association. Os motivos? Contamos em detalhes a seguir.

A grande piada

Para início de conversa, o Globo de Ouro sempre foi visto como uma piada pela indústria e pela imprensa. Claramente influenciáveis, os votantes do prêmio levavam em conta a fama dos artistas e a verba investida nas campanhas. Assim, sempre foi comum ver grandes astros e estrelas indicados ao prêmio, muito embora estivessem muito longe de merecer tal reconhecimento. Johnny Depp e Jim Carrey, por exemplo, têm mais nomeações do que podem lembrar. O mesmo vale para os grandes diretores: valia mais a pena indicar um figurão do que um cineasta realmente merecedor.

Nesta perspectiva, o Globo de Ouro se afastava cada vez mais do papel de termômetro do Oscar, algo que, à bem da verdade, nunca foi. Nos últimos anos, até acertou em algumas escolhas, mas também errou a mão em várias outras. Na última edição da festa, por exemplo, nomeou Music para categorias importantes. Trata-se de um vergonhoso projeto da cantora Sia; uma mistura tola de musical, comédia e drama que foi completamente destroçada pela crítica. O mesmo serve para The Prom, título da Netflix que angariou uma porção de críticas ao seu ator, James Corden. Resultado: Corden foi indicado ao prêmio mesmo tendo entregado uma das performances mais vergonhosas do ano.

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A lista de absurdos é longa. E se você fica chocado com a vitória de Green Book no Oscar, espere até lembrar que Legalmente Loira, Mamma Mia, Burlesque, O Turista, Red foram todos indicados a Melhor Filme. E mais, filmes como Perdido em Marte Corra! foram considerados como Comédia/Musical. Mas se o problema fossem apenas péssimos indicados e vencedores, estaríamos numa situação tranquila. O problema, contudo, é que a trajetória do Globo de Ouro vem cercada de roubos, tráfico de influência, preconceitos e assédios.

Globo de Ouro 2016

Investigação esclarece problemas que todos já conheciam

A primeira bomba nas estruturas da HFPA foi um artigo publicado pelo Los Angeles Times. Na investigação do veículo, fica clara a postura da organização em sua “cultura de corrupção”. Isenta de impostos, a organização operava como um cartel, prejudicando pequenos jornalistas e, além disso, monopolizando todos os acessos importantes da imprensa. Da mesma forma, o texto ainda aponta dúvidas sobre a legitimidade da associação, bem como as qualificações de seus membros e a ética dos mesmos. Para completar, uma informação apenas confirma o que todos já esperavam: não havia nenhum negro no grupo.

Dois dias antes da premiação deste ano, no entanto, protestos esquentaram a internet. O ponto principal era a falta de representatividade entre os membros da HFPA. Entre os nomes que protestaram ativamente estavam Kerry Washington, Sterling K. Brown, Amber Tamblyn, Ellen Pompeo, Jurnee Smollett, Amy Schumer, Sean Hayes, Simon Pegg, DeVon Franklin, America Ferrera, Mark Duplass, Busy Phillips, Dakota Johnson, Patton Oswalt e Laura Dern.

A soma de todos os medos: escândalos e péssima audiência

A segunda bomba é muito clara: a edição do Globo de Ouro deste ano teve a pior audiência da história do programa. Com média de 5.4 milhões de espectadores, o show teve uma queda de mais de 60% comparada à edição de 2020. Menos de uma semana depois, a HFPA divulga uma nota prometendo reformas nos próximos 60 dias, buscando aumentar a diversidade da organização. Para isso, a organização contrata consultores e especialistas para tornar o grupo mais diversos e ético. Desta forma, a HFPA teve que buscar fora de sua organização pessoas que garantam diversidade e cumprimento de leis básicas de ética.

E se você achou que o que estava ruim não podia piorar, repense. Em 15 de março, mais de 100 representantes de firmas de representação assinam uma carta aberta afirmando que, sem reformas urgentes, o Globo de Ouro certamente perderá acesso às suas vastas – e estelares – listas de clientes. Todo ator e atriz em Hollywood tem o seu agente, a sua firma que o representa. Imagine o Globo de Ouro, que só se importa com holofotes, perder o acesso aos maiores nomes da indústria!

Passo em falso em meio a crise

A promessa da HFPA não poderia ser mais ridícula: adicionar 13 membros negros até o fim do ano. A tola decisão nem é o pior que poderia acontecer para a organização naquela semana. Assim, como se nada poderia ficar ainda mais feio, Philip Berk, um membro da HFPA (e ex-presidente do grupo) enviou e-mails declarando que o Black Lives Matter é um “movimento racista de ódio” e criticou a co-fundadora Patrisse Cullors, chamando-a de “Marxista treinada”.

No dia 20 de abril a emissora NBC, que transmite o Globo de Ouro, condena Berk: “Enquanto nós continuamos esperando pelos planos de reforma da HFPA, uma mudança radical nesta questão é essencial para que a NBC continue ao lado da HFPA e dos Globo de Ouro”. Era, portanto, o primeiro sinal de alerta da NBC para a associação.

Abandonar o navio! Abandonar o navio!

No mesmo dia, mas talvez mais tarde do que o ideal, a HFPA expulsa Berk. Mas ele não é o único a sair do grupo. Sabe aquele povo contratado em março para aconselhar e arrumar a casa? Pois é. A coisa era tão feia que eles desistem do trabalho e abandonam a organização. O caso envolvendo Berk, segundo informações, foi a “gota d´água” para que a empresa responsável pelo gerenciamento de crises saísse de cena.

A fundadora e CEO da empresa é Judy Smith. Judy, para quem não sabe, foi a inspiração para a série Scandal. Ela é, para todos os efeitos, a verdadeira Olivia Pope, já que foi a base para a memorável personagem. Smith encarou diversas crises em sua carreira e foi uma das produtoras da série, mas o Globo de Ouro foi um problema e uma vergonha muito grandes para lidar. Se nem a verdadeira Olivia Pope foi capaz de arrumar a bagunça, podemos ter ideia do problema da HFPA.

Segundo notas do The Hollywood Reporter, Smith “ficou absolutamente frustrada com a negação da organização, que refutava e não escutava nenhum conselho e não assumia nenhuma ação concreta”. Logo, a conclusão a qual chegaram: os problemas estavam tão enraizados que seria uma batalha perdida. O consultor de diversidade e uma das maiores firmas da indústria também abandonam a associação.

O povo – e a indústria – contra o Globo de Ouro

A HFPA, então, apresenta planos de mudança. Segundo a Variety, os planos envolvem aumentar o número de membros negros e restringir os brindes aceitos pelos votantes. Além disso, uma das decisões da organização é controlar os pagamentos dos membros por trabalhos em comitês. O projeto, então, foi aceito pelos membros da HFPA: setenta e dois membros votaram pela aprovação das mudanças e três votaram contra.

Foi na última semana, contudo, que as coisas parecem ter ido ladeira abaixo de forma definitiva. Em carta aberta, a Netflix anuncia que boicotará os Globos de Ouro. Ted Sarandos escreveu, em parte:

“Nós não acreditamos que estas supostas novas políticas – particularmente sobre o tamanho e a velocidade com que os novos membros aparecerão –  vão resolver as questões de diversidade e inclusão da HFPA […]. Assim, estamos interrompendo quaisquer atividades com a sua organização até que mudanças realmente consideráveis sejam tomadas. A Netflix e muitos dos talentos e criadores com os quais trabalhamos não poderão ignorar a falha coletiva da HFPA em resolver estas questões cruciais com urgência e rigor”

A WarnerMedia toma um caminho semelhante ao da Netflix e declara: “as mudanças anunciadas estão muito longe de abrandar nossas preocupações.”. Logo, a decisão é severa e a gigante da indústria afirma: a HFPA estará proibida de participar de conferência e quaisquer outros eventos da empresa enquanto novas e válidas mudanças sejam implementadas.

Tom Cruise devolve os prêmios que recebeu e mais atores protestam contra a HFPA

Tom Cruise, um dos maiores nomes de Hollywood, devolveu os três Globos de Ouro que venceu na carreira. O protesto aconteceu no dia 10 de maio e simboliza os últimos respiros da HFPA e de sua premiação. Desta forma, ator enviou os três troféus para a associação: Melhor Ator em Drama por Nascido em 4 de Julho, Melhor Ator em Comédia por Jerry Maguire e Melhor Ator Coadjuvante por Magnólia. 

Scarlet Johansson é outro nome do alto escalão a protestar firmemente contra a HFPA:

“Como uma atriz promovendo um filme, é esperado que participemos da temporada de prêmios, marcando presença em coletivas de imprensa e premiações. No passado, isso queria dizer que enfrentaríamos perguntas sexistas e comentários próximos de um assédio sexual por parte de certos membros da HFPA. Esta é a razão exata pela qual eu, por muitos anos, recusei participar das conferências da HFPA. A HFPA é uma organização que foi legitimada por tipos como Harvey Weinstein para criar momentum para o Oscar; e a indústria apenas seguiu a onda. A menos que haja uma reforma fundamental na organização, eu acredito que seja hora de dar uma passo para longe da HFPA e focar na importância e na força da união de nossos grupos e da indústria como um todo”

O último prego no caixão

O golpe final veio no mesmo dia 10, em que Cruise devolveu os prêmios. A NBC, então, que já havia acendido a luz vermelha, decidiu cancelar o Globo de Ouro, optando por não transmitir a edição de 2022. Na nota, a emissora afirma:

“Nós continuamos acreditando que a HFPA está comprometida em realizar importantes reformas. Mudanças desta magnitude, entretanto, requerem tempo bem como trabalho. E nós profundamente acreditamos que a HFPA precisa de tempo para fazer isso corretamente. Assim, a NBC não irá exibir os Globos de Ouro em 2022. Assumindo que a organização execute seus planos, nós esperamos estar em posição para transmitir o evento em Janeiro de 2023.”

Apesar do desfecho agridoce da nota, prometendo um retorno em 2023, é seguro considerar a HFPA e o Globo de Ouro cancelados. Dificilmente alguma outra emissora assumirá a transmissão e parceria com um grupo tão enrascado. Além disso, os números de audiência estão muito longe de serem satisfatórios, o que complica ainda mais a situação da Hollywood Foreign Press. Com o total repúdio da indústria, dos artistas e do público, talvez não tenhamos Globo de Ouro tão cedo.

 

E então, sabia de todos os escândalos do Globo de Ouro? Deixe nos comentários e, igualmente, continue acompanhando as novidades do Mix de Séries.

Sobre o autor

Matheus Pereira

Coordenação editorial

Matheus Pereira é Jornalista e mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul. Depois de quase seguir carreira na Arquitetura, enveredou para o campo da Comunicação, pelo qual sempre nutriu grande paixão. Escritor assíduo na época dos blogs, Matheus desenvolveu seus textos e conhecimentos em Cinema e TV numa experiência que já soma quase 15 anos. Destes, quase dez são dedicados ao Mix de Séries. No Mix, onde é redator desde 2014, já escreveu inúmeras resenhas, notícias, criou e desenvolveu colunas e aperfeiçoou seus conhecimentos televisivos. Sempre versando pelo senso crítico e pela riqueza da informação, já cobriu eventos, acompanha premiações, as notícias mais quentes e joga luz em nomes e produções que muitas vezes estão fora dos grandes holofotes. Além disso, trabalha há mais de dez anos no campo da comunicação e marketing educacional, sendo assessor de imprensa e publicidade em grandes escolas e instituições de ensino. Assim, se divide entre dois pilares que representam a sua carreira: de um lado, a educação; de outro, as séries de TV e o Cinema.