Crítica: Inventando Anna não empolga e frustra expectativas

Inventando Anna possui uma premissa deliciosa e irresistível, mas com um roteiro vacilante e problemas de foco, se perde.

Inventando Anna
Imagem: Netflix / Divulgação

Na manhã que descobri que a Netflix tinha dado o golpe do século e tirado Shonda Rhimes da Disney, fiquei empolgado pelo que viria por aí. Scandal e How To Get Away with Murder, ambos da Shondaland, me empolgaram o suficiente para me manter fiel as criações da produtora. Até mesmo a fracassada (e maçante) Still Star-Crossed este que vos escreve assistiu em nome da devoção. Aí veio Bridgerton, que mesmo não sendo criação de Rhimes, tinha seu selo de qualidade. A série de época, de fato, me deixou empolgado pelo que Inventando Anna poderia oferecer no futuro. Aí veio a série de fato.

Para quem não sabe ou se perdeu, a minissérie é baseada numa história real. Movida por ganância, instinto de sobrevivência e arrogância, Anna Delvey, ou Anna Sorokin como foi batizada, queria o mundo. Usou de todas as suas artimanhas, como elegância, objetividade e charme para subir na vida. Enganou boa parte da elite de Nova York e fez milhões de dólares. A queda foi impressionante e culminou com uma sentença prisional, multa e deportação para Alemanha.

Inventing Anna
Imagem: Netflix / Divulgação

Jornalismo 2.0

Eu gosto que a história não tenha sido contada do ponto de vista da própria Anna. Afinal, não sentiria pena de uma estelionatária nem se eu tentasse. Sendo assim, a ideia de narrar sob a perspectiva da jornalista que revelou toda a história me ganhou. Anna Chlumsky entregou um trabalho incrível, diria que visceral, ao dar vida a Vivian Kent, personagem inspirada em Jessica Pressler. O problema é que Hollywood não sabe, e ainda não descobriu, como retratar um trabalho jornalístico sério. Ou até mesmo como uma redação profissional funciona. Diria, portanto, que é um problema crônico.

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Filmes tendem a acertar mais, seja Todos os Homens do Presidente ou Nos Bastidores da Notícia, mas séries têm uma relação medonha ao retratar jornalistas ou uma redação de jornal, revista ou site. Em Inventando Anna não é diferente. Num determinado momento, Vivian abandona a ética profissional e imparcialidade e decide torcer para personagem central.

Não só ela, como também seus colegas de trabalho. Invadir a casa dos pais da Anna? Pressionar seu advogado? Mentir? Ser antiética? Nesses tempos, onde a confiança em mídia está historicamente baixa, responsabilidade deveria ser uma máxima inegociável. Recomendo, por fim, um estudo espetacular Universidade do Tennessee sobre a forma errônea que Hollywood retrato o trabalho jornalístico.

Inventando Anna
Imagem: Netflix / Divulgação

Coadjuvantes efêmeros

Além de falhar na representação jornalística, o roteiro de Inventando Anna simplesmente abandona seus coadjuvantes. Depois de três episódios, Val (James Cusati-Moyer) simplesmente desaparece. Ele é uma das primeiras vítimas da Anna, mas sequer aparece no julgamento. Chase (Saamer Usmani), o aparente único amor da protagonista, se isola em Dubai para tratar com xeique e não é mais encontrado após a entrevista com Vivian.

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Nora Radford (Sally Burton), perde aparentemente alguns milhões, mas desaparece e sequer registra ocorrência contra Anna. Talia Mallay (a espetacular Marika Domińczyk) seria uma testemunha estelar no julgamento. Ela foi enganada e desmoralizada. Mas também não tem vida longa. Por fim, lembro também do personagem de Joshua Malina que investe um valor absurdo no aplicativo de Chase, mas que também some instantaneamente. Ele investiu e não apareceria de novo?

Inventando Anna
Imagem: Netflix / Divulgação

Crítica social às avessas

No desenvolvimento da história, fica bastante claro que a minissérie busca fazer uma crítica social irresistível aos nossos tempos. O culto a beleza, dinheiro e aparências. Assim como cultura de influenciadores. O comentário mostra-se apropriado e bem vindo, mas o roteiro abandona-o no último episódio. Preterido por um impulso incompreensível de humanizar a protagonista e clamar ao telespectador por empatia. Por isso, confesso que não entendi e também não correspondi.

Em suma, Inventando Anna possui atributos. A performance de Julia Garner, a possibilidade de rever o elenco de Scandal e os figurinos de Laura Frecon e Lyn Paolo, duas longas colaboradoras de Shonda Rhimes. Me frustrou, contudo, que o roteiro tenha falhado miseravelmente na sua missão de contar essa história. Não faz jus ao trabalho de Jessica Pressler. Tampouco oferece um escapismo da desgraça do mundo real. Sendo assim, recomendo que assistam. Mas sabendo que, dessa forma, vão encontrar ao meio morno.

Nota: 2/5

Sobre o autor

Bernardo Vieira

Redação

Bernardo Vieira é um jornalista que reside em São José, Santa Catarina. Bacharel em direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina, jornalista e empreendedor digital, é redator no Mix de Séries desde janeiro de 2016. Responsável por cobrir matérias de audiência e spoilers, ele também cuida da editoria de premiações e participa da pauta de notícias diariamente, onde atualiza os leitores do portal com as mais recentes informações sobre o mundo das séries. Ao longo dos anos, se especializou em cobertura de televisão, cinema, celebridades e influenciadores digitais. Destaques para o trabalho na cobertura da temporada de prêmios, apresentação de Upfronts, notícias do momento, assim como na produção de análises sobre bilheteria e audiência, seja dos Estados Unidos ou no Brasil. No Mix de Séries, além disso, é crítico dos mais recentes lançamentos de diversos streamings. Além de redator no Mix de Séries, é fundador de agência de comunicação digital, a Vieira Comunicação, cuido da carreira de diversos criadores de conteúdo e influenciadores digitais. Trabalha com assessoria de imprensa, geração de lead, gerenciamento de crise, gestão de carreira e gestão de redes sociais.