Crítica: 2ª temporada de O Mecanismo apresenta texto fraco e não convence

O Mecanismo chega com segunda temporada. Confira crítica.

Imagem: Netflix/Divulgação

Segunda temporada de O Mecanismo se esforça, nada e morre na praia

O Mecanismo retorna na Netflix para sua segunda temporada. Com ela, a série se propõe a continuar contando os eventos inspirados nos fatos que permearam a política brasileira nos últimos anos. Entretanto, mesmo se distanciando do tom “engessado” do primeiro ano, ela ainda apresenta um texto bem fraco, repleto de frases clichês que chegam a incomodar qualquer fã de uma boa produção policial.

Mais um enlatado nacional

A primeira temporada de O Mecanismo tinha um elemento bem interessante em sua narrativa: uma forte inspiração em séries policiais norte-americanas. Fosse pelo formato, edição ou até mesmo o modo em que era contada a história, tais características eram expressadas em muitos detalhes. Naquele momento, utilizou-se de elementos interessantes para contar uma história criminal sem ser muito piegas. Mas nessa nova leva, tais elementos foram esquecidos, tornando a narrativa um tanto chata e sem audácia.

Houve um certo fator apelativo ao fazer o público acreditar que o protagonista vivido por Selton Mello morria na primeira temporada. O texto tinha tudo para induzir a trama por um caminho bem audacioso, mas optaram por saídas clichês afim de resgatar seu protagonista da morte. O resultado foi: O Mecanismo saiu de uma atração inspiradas por séries americanas e passou a caminhar pelo vale das novelas.

O inimigo agora é outro?

O campo para o segundo ano já havia sido preparado. Os qualificados “ladrões” começaram a ser presos, mas ainda faltava alguns nomes interessantes a serem explorados. Ricardo Brecht, o personagem que se inspira em Marcelo Odebrecht, ainda precisava ser derrubado. E sua derrocada seria decisiva para o andamento e uma das maiores operações policiais já feita no Brasil.

Com essa pedra cantada, os novos episódios contemplam esse objetivo ao investir na trama de Bretch, com a intenção de que ele se torne o grande antagonista da trama. Entretanto, talvez o vilão de O Mecanismo vá além dos personagens, pairando na cabine dos roteiristas.

Nadando contra uma corrente que a própria série apresentou em sua primeira temporada, agora o foco é o “complô” para depor a Presidente Janete Ruscov – sim, a personagem inspirada em Dilma Rousseff. Além disso, há uma mudança total de tom ao representarem o juiz Paulo Rigo (alô, Sérgio Moro), que passa de “herói nacional” para peão de político.

Assim, as linhas aqui percorridas soam um tanto hipócritas, se voltarmos às falas de personagens e dos próprios produtores da série, à época do lançamento do primeiro ano. Dessa forma, a falta de isenção que é mascarada na primeira temporada, continua a atuar por aqui. Só que agora ela se expressa em uma necessidade de que “é preciso atirar para todos os lados“, ou “é preciso mostrar que a corrupção existe em qualquer canto“, fazendo parte da peça do Mecanismo. José Padilha defende que essa era também sua visão anteriormente, mas talvez não compreenda que isso não ficou nem um pouco claro. Bem como, em certos momentos, pareceu unilateral. Certamente, o produtor não imaginava que sua “pisada de bola” na primeira temporada fosse refletir no texto do segundo ano, transformando o seu plot central forçado – em muitos sentidos.

A trama

A segunda temporada tem ponto de partida na perseguição a Ricardo Bretch, o empreiteiro que falta a ser derrubado dentro do Mecanismo. Para isso, Ruffo passa a vigiar Maria Tereza, responsável pelas operações estruturadas do “meliante”. Ela é aquela pessoa que sabe de tudo. Tudo mesmo. Logo, vira alvo tanto para mocinhos quanto para bandidos. Quem pegar primeiro, ganha o prêmio: as informações que podem derrubar Bretche.

Nessa tentativa do Ricardo de apagar a própria “funcionária”, é que os personagens retornam do ponto onde fomos deixado no primeiro ano.

Em Brasília, o clima é de formação de quadrilha. Dessa forma, a série dá margem para interpretações de que o “espírito” do texto é outro. É preciso mostrar um vice-presidente se esquematizando com senadores e outros políticos, para que ele mesmo vire Presidente. Para os brasileiros, a pedra está cantada: o impeachment será abordado.

Já a menção ao trabalho do juiz Paulo Rigo, ganha tom de dúvidas. Sua relação com interesses políticos é retratada de forma bem clara. Coincidência, ou não, Padilha mostrou sua insatisfação de forma pública contra o Juiz Sérgio Moro, em recentes artigos publicado na internet. Ironia do destino?

Também há a liberação de João Paulo Rangel (JPR), que acontece logo no começo da temporada. Algo que até poderia ser interessante, se fosse explorada de forma correta. Todas essas tramas se conectam com a busca pela prisão de Ricardo, e aos poucos as peças de um quebra-cabeça vão sendo montadas.

Produção fraca. Personagens mais ainda…

Entretanto, o grande problema de O Mecanismo está mais voltado para o roteiro do que a falta de “imparcialidade”. As falas são extremamente pobres. Bem como, a construção da narrativa, que volta e meia é interrompida por cortes de cenas inesperados e sem sentidos.

Além disso, há um fraco desenvolvimento em relação aos personagens. Não há qualquer esforço da produção para que o público se identifique com algum deles.

Selton Mello é um ótimo ator, mas sofre para dar vida a um dos piores personagens de sua carreira. Na primeira temporada, houve um problema sério em sua fala extremamente confusa. Era necessário voltar algumas cenas para entender o que o personagem realmente dizia. No segundo ano, há uma melhora. Entretanto, seu personagem ainda parece fora do tom. Fora isso, ainda precisamos continuar a aguentar alguns descontroles emocionais do personagem, que favorece um clichê em que é preciso tornar o protagonista masculino em uma pessoa mais violenta. Sem dúvidas, isso aparenta ser um patriarcalismo enrustido dos produtores falando mais alto. Mas que a maioria finge não enxergar.

Selton Mello não convence como Ruffo em segunda temporada de O Mecanismo. Imagem: Netflix/Divulgação

Pelo lado positivo…

De todo o cast, talvez somente Verena chama atenção. E mesmo assim, nesta segunda temporada, ela acaba indo pelo mesmo caminho de Ruffo. Assim, torna-se vítima do próprio heroísmo fajuto proposto pelo texto. De qualquer forma, Carol Abras salva suas cenas com uma boa interpretação, mandando o recado de que a mulher pode sim ter vez em um ambiente predominantemente masculino.

Vale ressaltar, também, a atuação de Enrique Díaz, como Roberto Ibrahim. Ao representar o personagem, Díaz aparece como um suspiro de qualidade em meio a um roteiro tão confuso como este.

Frustração

No geral, a frustração ainda predomina ao assistirmos O Mecanismo. Sem qualquer apelo, a série se perde na tentativa da imparcialidade, e falha ao apresentar a trama de forma clara para quem não é do Brasil, ou mesmo para quem não tem conhecimento do assunto. Ficarei surpreso se ela alcançar a mesma audiência – ou alcance nas redes sociais – que a primeira temporada obteve. Mais ainda, se for renovada além disso.

A forçação de barra para algumas falas chega a ser desgastante. Pelo menos, houve uma diminuição das frases de efeito, que na primeira temporada eram jogadas de 5 em 5 minutos para o espectador. Mas elas ainda existem, e isso incomoda.

Assim, ao final, o sentimento é de “perda de tempo” para uma série que tem um bom investimento financeiro por parte da Netflix, bem como o potencial para ser uma análise inteligente do cenário político brasileiro.

Uma pena…

Sobre o autor
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Anderson Narciso

Criador do Mix de Séries, atua hoje como redator e editor chefe do portal que está no ar desde 2014.Autor na internet desde 2011, passou pelos portais TeleSéries e Box de Séries.Fã de carteirinha de Friends, ER e One Tree Hill, é aficionado pelo mundo dos seriados. Também é fã de procedurais, sabendo tudo sobre o universo das séries Chicago, Grey's Anatomy, entre outras.

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